domingo, 26 de fevereiro de 2012

ENTREVISTA COM O ESCRITOR RENAN DE ANDRADE


Renan de Andrade é escritor e graduado em Letras-Português pela UFES. É professor da rede particular de ensino. “Cenho” é o primeiro livro de poemas do capixaba Renan Braga Andrade, ou "Renan de Andrade", como preferirem. Renan assumiu esse nome como forma de homenagem e, também, por ser comum aos grandes poetas que o inspiram: Mário, Drummond e Oswald. O poeta começou a escrever aos 11 anos de idade, motivado por um trabalho de escola. Assim, se apaixonou pela arte literária. Confira, abaixo, a entrevista com o escritor:

1 – Qual foi o seu primeiro contato com a arte literária? Como se deu o interesse?

Resposta: Foi aos 11 anos de idade. Eu estava na 4ª série primária e a escola onde eu estudava estava promovendo, pela primeira vez, um evento literário chamado ‘’Criar’’. Todos os alunos tinham de produzir poemas, e os selecionados iriam ser publicados em um livro. O meu texto foi um dos selecionados e até a 8ª série eu permaneci publicando neste evento. Mas foi no ensino médio que tudo se consolidou, quando conheci o professor de literatura e também poeta David Bellmond. Ele passou a direcionar algumas leituras para mim e foi um dos primeiros leitores dos meus poemas. Depois acabou prefaciando o meu livro.

2 – Quais foram os autores que mais influenciaram o seu fazer poético?

Resposta: Eu acho que acabo sofrendo influência de tudo que leio. Não sei se isso é algo bom ou ruim, mas faz parte da formação de todo o escritor. Tento ter o cuidado de reter o que há de bom nas coisas que leio e expurgar aquilo que não acho interessante. Nomes como Drummond, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Rosa são referências constantes no meu trabalho.

3 – Como e quando surgiu a idéia de seu primeiro livro? Fale-nos acerca de “Cenho”.

Resposta: Como comecei a publicar os meus rabiscos bem cedo, o desejo de ter um livro só meu era uma ideia fixa. Cheguei a organizar um livro em dupla com um amigo meu, mas por falta de condições o projeto não saiu do papel. Aí iniciei, até a minha entrada no curso de Letras na UFES, uma fase mais marginal, onde eu fazia os textos, tirava cópia e dava para algumas pessoas lerem. Isso foi importante, pois passei a ter várias opiniões sobre aquilo que eu escrevia, revi alguns posicionamentos e abandonei alguns cicerones poéticos. Na UFES, eu pude encontrar espaço para discutir literatura e ler com mais qualidade. Quando conheci o amigo e poeta Ricardo Salvalaio, entusiasta das letras, pude voltar a sonhar com o livro. Salvalaio foi decisivo na formatação do projeto ‘’Cenho’’ e o livro acabou saindo pela Lei Rubem Braga. Aí, eu aproveitei bastante do que já tinha pronto do projeto em dupla, adicionei alguns poemas de quando eu já cursava Letras e o resultado é o ‘’Cenho’’, um livro onde se vê claramente um processo de evolução criativa e fases distintas de vivência.

4 – Percebemos que sua obra sofreu uma grande influência da Escola Romântica e, logicamente, de Álvares de Azevedo. Como você explica tal assertiva?

Resposta: É algo de encantamento juvenil. Como eu comecei a escrever bem cedo, Álvares de Azevedo foi um dos meus primeiros cicerones poéticos. E como ele é um autor que também encanta por sua biografia controversa, eu mergulhei fundo na leitura de livros como ‘Lira dos vinte anos”, “Macário” e “Noite na taverna”. Daí as várias referências em ‘’Cenho’’. Soma-se a isso tudo, o discurso de Renato Russo em seu último disco, “Legião Urbana - A tempestade ou O livro dos dias”, o ambiente nebuloso, a melancolia, as saudades, as despedidas, tudo isso, ao me ver, dialogava também com o Romantismo de Azevedo. E sendo Russo também um grande cicerone, me influenciei bastante. Mas atualmente isso não é mais tão assim (risos).

5 – Como funciona seu processo criativo? Mais inspiração ou mais expiração?

Resposta: No início era mais expiração. Como eu me influenciei bastante pelo Romantismo, acabei concebendo uma literatura bastante pautada na subjetividade. Não que isso seja algo ruim, mas hoje vejo que é complicado expor em seus textos seus dramas pessoais, espécie de desabafos-vômitos-poemas. Hoje tento conciliar as duas instâncias. Mas em geral, meus textos nascem de situações cotidianas, depois acabam sendo mais maturados, até que os expurgo de vez.

6 – O que você pensa do nosso atual cenário literário?

Resposta: Sinceramente, é triste. Faz muita falta no Espírito Santo a existência de uma editora. Não temos. Temos gráficas que até fazem um trabalho editorial interessante, mas pecam na divulgação e distribuição dos livros que publicam. As leis de incentivo à cultura tem feito um trabalho interessante disponibilizando verba para os artistas, mas ainda é pouco para um estado como o nosso, que infelizmente é muito provinciano em matéria de literatura. Mas o problema não é só isso. Alguns editais de incentivo à cultura acabam publicando sempre os mesmos artistas, que se revezam no monopólio. É lamentável que alguns deles, além de monopolizarem o cenário, fechem-se em seus discursos e não aceitem que artistas talentosos possam aparecer. Tudo bem que literatura também é um espaço político, mas não há necessidade de politicagens. Existem alguns autores que nunca publicaram por incentivo próprio e curiosamente publicaram suas principais obras na mesma lei de incentivo. É lamentável que isso aconteça.

7 – Segundo Chico Buarque, a literatura de nosso século se alimenta de várias mídias, como o cinema e a música. Em seu estro, outras artes também perpassam?

Resposta: No Brasil, quem faz arte não tem do que reclamar no que diz respeito à riqueza cultural. A música é algo maravilhoso e o cinema vem numa crescente, o que fomenta boas influências. A minha poesia dialoga o tempo todo com a MPB. Além de Renato Russo, Chico e Caetano são referências para mim.

8 – Quais são seus novos projetos literários?

Resposta: Há tempos venho trabalhando no livro “Entre ver e tocar há dores”, minha próxima obra. A obra será parte contos parte poemas. Em todos os textos, de uma forma ou de outra, irão conter três signos: a visão, o toque e a dor. Nos poemas, apresentarei algo bastante diferente do que o leitor viu em ‘’Cenho’’. E na prosa apresentarei uma linguagem bastante enxuta, próxima dos microcontos. Será um prazer compartilhar com “Outros 300” alguns textos que farão parte da obra. Agradeço a oportunidade de falar com vocês!


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